As infecções fúngicas invasivas (IFI) estão associadas a quadros de imunossupressão grave, geralmente experimentadas por pacientes onco-hematológicos ou transplantados de órgãos sólidos, que frequentemente apresentam os fatores de risco clássicos.

Fatores de risco clássicos para infecções fúngicas invasivas (IFI)
  • Pacientes hematológicos e transplantados de órgãos sólidos (incluindo os neutropênicos)
  • Uso prolongado de corticóides
  • Imunossupressão de células B ou células T (por exemplo, Rituximabe ou Timoglobulina)
  • Imunodeficiência hereditária grave
  • Doença do enxerto vs. hospedeiro agudo grau III ou IV envolvendo o intestino, pulmões ou fígado e refratária aos corticoesteroides

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IFI: Infecções fúngicas invasivas

Nos últimos anos, entretanto, tem-se apresentado interesse progressivo sobre o potencial papel das IFI enquanto complicadas da evolução de adultos internados críticos por quadros graves de influenza, covid-19 e exacerbações de DPOC, na ausência dos fatores clássicos supracitados.

Entretanto, estudar essa população é um grande desafio, pela grande heterogeneidade. Surgiu, então, a necessidade de padronização de conceitos, com o objetivo de gerar comparabilidade e viabilizar a generalização dos dados oriundos de pesquisas clínicas futuras sobre o tema.

Com esse propósito, foi concebido o projeto Doenças Fúngicas Invasivas em Pacientes Adultos em UTI (FUNDICU), baseado em um consenso de especialistas, cujos principais pontos traremos na sequência.

Uma candidíase invasiva

A candidíase invasivarepresentado pela candidemia e candidíase profunda, é a IFI mais comum entre adultos criticamente enfermos. Trata-se de uma condição de alta mortalidade, alcançando 50% entre os indivíduos com choque séptico. Uma de suas características morfológicas mais marcantes é a presença de células em brotamento, marcadores de divisão binária intensa, em contraste com as hifas ou pseudo-hifas, que normalmente representam apenas colonização.

O consenso FUNDICU nos traz alguns conceitos importantes sobre a candidíase invasiva:

  • Candidase invasiva comprovado: refere-se ao isolamento de Cândida spp., seja por microscopia direta, cultura ou histologia, em amostras de sítios normalmente estereis.
  • Candidemia comprovada: isolamento de Cândida spp. em pelo menos uma hemocultura proveniente de punção venosa (não são consideradas amostras advindas de refluídos de cateteres).
  • Candidase profunda comprovada: coleções profundas obtidas de sítios normalmente estereis, como a cavidade abdominal, pleural ou o mediastino, em pacientes sem suspeita de perfuração da mucosa nem histórica cirúrgica recente e cuja punção com técnica estéril, seja cirúrgica, ecoguiada, guiada por TC ou obtida por dreno inserido a menos de 24 horas, tenha evidenciado Cândida spp.
  • Candidíase invasiva provável:
    • Candidemia provável: presença presumida por critérios clínicos, dados micológicos de sítios não estéreis e biomarcadores antigênicos fúngicos, com destaque para o (1,3)-ß-D-glucana (BDG).
    • Candidíase profunda provável: identificação de Cândida spp. em coleções oriundas de sítios presumivelmente estéreis, mas na sequência de violação dos mecanismos de integridade: perfurações viscerais ou cirúrgicas.

Nos casos de candidíase profunda é provável, mas em que a dor gastrointestinal ou urogenital tenha sido controlada (< 24 horas), a identificação de Candida spp. nenhuma lavagem peritoneal deve ser interpretada apenas como colonização. Entretanto, a positividade em amostras obtidas 24 horas após uma intervenção de controle ou na presença de peritonite recorrente em virtude de fístulas anastomóticas, assim como a candidemia concomitante, devem ser valorizadas como elementos sugestivos de infecção.

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Ainda em relação à candidatura profunda provável, além dos critérios micológicos, há a exigência de ao menos um classificação clínica, entre os quais:

  • Lesões compatíveis com fundoscopia;
  • Anormalidades radiológicas consistentes e não explicadas por outras etiologias decorrentes de inoculação direta ou disseminação hematogênica: endocardite, osteomielite, artrite, mediastinite ou meningite.

Aspergilose invasiva

A aspergilose pulmonar invasiva (API) é a apresentação mais comum da aspergilose entre adultos críticos. Contudo, diferentemente do que se espera nos imunossuprimidos, os sinais radiológicos clássicos da API, como o sinal do halo ou do ar crescente, muitas vezes estão ausentes e a acurácia de biomarcadores, como as galactomananas ou o teste de amplificação de DNA, é menor.

Portanto, o desafio do diagnóstico é maior, de forma que a confirmação diagnóstica da API muitas vezes depende da histologia. O problema é que a permanência em CTI é frequentemente acompanhada por restrições ao procedimento, como a vigência de instabilidade hemodinâmica, ventilação mecânica ou coagulopatia.

Outro grande desafio da aspergilose é a diferenciação entre colonização e infecção. Nesse sentido, duas ferramentas adicionais são de ajuda discriminatória: a definição AspICU a dosagem de galactomananas sem lavagem bronquioloalveolar (BAL).

O consenso nos traz os seguintes cenários:

  • Aspergilose invasiva confirmada: combinação entre detecção de hifas compatível com Aspergillus por meio de cultura ou PCR e documentação histológica ou citopatológica de invasão tecidual no sítio normalmente estéril ou proveniente de lesão pulmonar suspeita de biópsia ou aspiração por agulha.
  • Aspergilose pulmonar invasiva (API) ou aspergilose traqueobrônquica (ATB) prováveis: exige a presença combinada de ao menos um elemento de cada um dos 4 grupos que se seguem:

Elementos de probabilidade de aspergilose invasiva

Clínicas

  • Fevereiro > 3 dias após antibioticoterapia adequada
  • Recrudescência da febre após > 48 horas de defervescência, na vigência de antibioticoterapia adequada e ausência de outras causas aparentes
  • Hemoptização, dor torácica pleurítica ou atrito pleural
  • Dispneia (excetuando-se os pacientes em ventilação > 48 horas) ou agravamento de insuficiência respiratória a despeito de antibioticoterapia afetando e suporte ventilatório

Hospedeiro

  • Gripe
  • COVID 19
  • DPOC moderou uma sepultura
  • Doença hepática crônica avançada descompensada
  • SIDA com CD4 < 200/mm³
  • Malignidades sólidas

Imaginológico

  • Broncoscopia: ulcerações, nódulos, pseudomembranas, placas e/ou escaras traqueobrônquicas
  • TC de tórax: infiltrados pulmonares ou cavitações a TC de tórax não atribuíveis a outras etiologias

Micológico

  • Presença de hifas ou positividade de culturas para Aspergillus ao BAL
  • Galactomananas séricas > 0,5 ODI
  • Galactomananas sem BAL > 1,0 ODI

ODI: índice de densidade óptica.

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Conclusão e Mensagens Práticas

  • Os conceitos que abordamos neste artigo são dedicados especialmente à pesquisa clínica sobre as infecções fúngicas invasivas (IFI) entre adultos não neutropênicos internados em unidades de terapia intensiva.
  • A abordagem mais conservadora, com restrição aos conceitos de IFI confirmada e voluntária, renunciando à “IFI possível”, visa gerar maior padronização e comparabilidade entre estudos futuros sobre o tema.
  • Dessa forma, esses conceitos não devem ser considerados, no momento atual, como gatilhos necessários para a introdução da terapia antifúngica empírica. A ressalva é importante, pois em pacientes graves e com probabilidade não negligenciável de infecções fúngicas invasivas (IFI), a terapia antifúngica empírica pode ser uma conduta razoável e salvadora de vidas.

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