Uma miríade de sentimentos convergem quando irmãos distantes se reúnem para desvendar o peso da recente morte de seu pai no terceiro longa-metragem do espanhol Álex Montoya, “La Casa”, adaptado da história em quadrinhos ganhadora de Eisner por Paco Roca e vendido por Latido Filmes.

O filme, que estreou ontem à noite, figura na seleção oficial da competição do Festival de Cinema de Málaga deste ano, tendo seu projeto “Lucas” já varrido a barra lateral do festival em 2020 – conquistando aplausos de melhor filme, ator (Jorge Motos) e Prêmio do Público.

Escrito por Montoya e Joana M. Ortueta, o projeto serve como uma reflexão agridoce sobre o arrependimento, o dever e os laços que nos unem, provando uma jornada reflexiva através da consciência coletiva que é posta em prática enquanto os três trabalham para reacender uma aparência de afeto enquanto peneiram através de lembranças pesadas e persistentes.

“Sou leitor de quadrinhos desde que me lembro e, como tal, acompanho de perto o trabalho de Paco”, disse Montoya. Variedade. “Fiquei surpreso com ‘La Casa’, pela sua capacidade de transitar com uma história muito limpa e aparentemente simples. A passagem do tempo, a memória e o legado já foram tratados mil vezes na tela, mas a obra do Paco o fez de forma especialmente eficaz, então rapidamente decidi adquirir os direitos”, explicou.

Produzido pelas produtoras valencianas Raw Pictures (“Lucas”) e Nakamura Films (“Stanbrook”), o projeto é uma execução fiel das representações suaves da vida de Roca e da sufocante passagem do tempo. Tons neutros e quentes, poeira mal assentada e vegetação murcha complementam o retrato de uma propriedade habitada mas abandonada. O diálogo franco e o silêncio se misturam na tela, realizando uma interpretação melancólica do trabalho amplamente envolvente de Roca.

“Adquiri os direitos instintivamente, mas demorei muito mais para decodificar como a história funcionava internamente para poder adaptá-la. Paco nos deu muita liberdade na hora de escrever, mas ainda assim o consultamos sobre mudanças no roteiro, porque para nós ele era o espectador 0, o representante de milhares de fãs de quadrinhos ao redor do mundo”, admitiu Montoya.

Alex Montoya
Crédito: Latido Filmes

“A fidelidade estética e tonal do filme responde a isso, permitindo que os fãs de quadrinhos entrem em nosso filme sem resistência, o que nos dá espaço para pequenas mudanças na estrutura e no roteiro”, acrescentou.

Repleto de nostalgia, o filme capta a sensação incômoda, mas reconfortante, de voltar para casa. Cada item encontrado lembra uma memória que foi gravada em pedra, prestando homenagem ao passado enquanto as emoções obscurecem o presente. Os flashbacks enquadram histórias habilmente e permitem um vislumbre da dinâmica familiar, projetada na tela como se fosse um projetor delicadamente usado.

“Analisando o quadrinho, percebi que um de seus pontos fortes era a justaposição do tempo real e da memória”, afirmou Montoya.

“Fiz vários testes de como traduzir isso para a tela e no final percebi que não me lembro das coisas com nitidez. Minhas lembranças são imagens abruptas, misturadas, reimaginadas, quase como se vistas através de um periscópio antigo. Por isso decidi enquadrá-los em uma pequena caixa central e dar-lhes uma textura semelhante ao Super8”, contou.

A cinematografia dá uma sensação de voar na parede. Um público é colocado para espiar por trás das folhas das plantas do terraço, através dos cômodos vazios da casa e em direção à imagem espelhada exibida na tela preta de uma televisão antiga queimada. Cada plano confere uma intimidade que serve uma narrativa focada na reflexão, convidando o espectador a juntar-se à família enlutada enquanto ela analisa a sua psique.

“A estética cinematográfica e a caligrafia cinematográfica são muito importantes para mim. Na minha opinião, é uma das formas mais eficazes de ancorar o filme na mente do espectador. A especificidade de um enquadramento preciso em um local real, com som e luz específicos, aborda furtivamente o nosso subconsciente”, opinou Montoya. “Em ‘La Casa’ tivemos muita sorte de acessar o local onde se baseia a história em quadrinhos, o que deu à filmagem um peso e autenticidade que se reflete na tela.”

O elenco inclui o vencedor do Goya David Verdaguer (“Piadas e Cigarros”), Luis Callejo (“Vale dos Mortos”), Óscar de la Fuente (“O Bom Chefe”), Olivia Molina (“Bajo Sospecha”), María Romanillos (“As Consequências”), Lorena López (“Los cómplices”), Marta Belenguer (“Asamblea”), Jordi Aguilar (“The Bar”), Miguel Rellán (“Tata Mía”) e Tosca Montoya.

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